Quando nos mudamos para a chácara do Raffo (bairro de Suzano, na Grande São Paulo), foi um alívio. O lugar tinha eletricidade! Até então tinha acompanhado meus pais no reconhecimento a dois ou três outros sítios, acho que em Jundiapeba ou Itaquaquecetuba. Eram lugares com ofurôs bem estranhos, escuros, de imigrantes japoneses que já tinham ido para melhor, e ficava me perguntando como é que iria ser a vida sem geladeira (pois eu ainda desconhecia a estória da refrigeração a querosene, ou mesmo do ferro a carvão…). E o pior, como é que iria negociar a cozinha com os fantasmas dos velhos proprietários, na base do lampião.
No Raffo, tirando o detalhe da luz, a estrutura que encontramos havia sido construída por outra família bem mais niponicamente original que a nossa, como nas demais chácaras que visitamos. O lugar tinha sido uma granja, que havia virado plantação de morangos. Meus pais tentaram prosseguir com os morangos, mas acho que faltou um pouco de algo para cuidar das frutas. Era necessário ficar sempre desbastando, passando chapinha e, de tempos em tempos, cobrir os canteiros com plástico preto. E eu achava meio estranho a maneira como a gente tinha que montar as cumbucas: colocar os morangos pequenos e os deformados por baixo e os grandes, bonitos só na camada de cima. O que virou é que, pouco tempo depois, passamos a despachar alface, agrião e couve para os F-4000 dos meus tios feirantes e para o ceasa.
Mesmo rápida – durou uma estação a empreitada com os morangos – foi praticamente a única experiência vermelha da nossa temporada no Raffo. Houve algum momento depois uma tentativa com tomates, mas meu pai, pelos olhares, acho que teve um acidente grave com agrotóxicos e os tomates foram definitivamente abortados.
Ademais, tomates não eram morangos, e morangos eram doces, mesmo que a gente não pudesse comê-los, pequenos ou grandes, sob o risco da sempre iminente intoxicação.